Lar dos Velhinhos: qualidade de vida na terceira idade
Projetos de Praia Grande voltados aos idosos são referência para outras cidades
Por Antonio Cassimiro | 3/9/2008

“A gente é velho quando, para descer uma escada, segura firme no corrimão. E os olhos olham para baixo para medir o tamanho dos degraus e a posição dos pés”. A definição é do psicanalista, educador, teólogo e escritor mineiro Rubem Alves, que completa 76 anos no próximo dia 15. Para ele, ser “velho” soa melhor que “idoso”.
A segunda forma é mais usual porque a primeira seria politicamente incorreta, um tanto grosseira. O Estatuto, no entanto, é do Idoso e, entre muitos direitos garantidos aos mais velhos, os mais cumpridos são o atendimento prioritário em bancos e o espaço especial em ônibus e metrôs. Mas o idoso, ou o velho, especialmente o de baixa renda, precisa de muito mais.
Em Praia Grande, um lugar chamado carinhosa e adequadamente de “Lar dos Velhinhos”, há mais de 20 anos acolhe essas pessoas num esforço de amenizar seus amargores de desprezo e ingratidão. O local era mantido pelo Rotary Club, que devido aos elevados custos de manutenção transferiu a administração da casa à Prefeitura, no início da década de 90. Na época, eram 40 abrigados. Hoje o lar atende 70 pessoas – a maioria não recebe visita de parente algum. É chamado agora de Lar São Francisco de Assis, mas o nome antigo persiste popularmente como referência ao lugar.
O diretor da unidade é o aposentado Silvio de Lima, que cuida de cada idoso com a mesma dedicação de um pai adotivo. Muitos dos que já estiveram no lar e morreram talvez tenham recebido ali o único tratamento decente de todas suas vidas. Alguns passaram por cirurgia, receberam medicamentos ou ganharam identidade, já que é comum sequer lembrarem dos próprios nomes. “Aqui tentamos dar um final de vida digno a essas pessoas”, comenta Silvio.
Dificilmente um estudo, por mais minucioso que seja, revelaria a quantidade de velhos que recebem de parentes tratamento digno no final de suas vidas. Sem que seja necessária uma estatística, é possível supor quais seriam as principais razões que levam pessoas a abandonarem seus pais, avós, tios ou sogros. Segundo Silvio de Lima, o motivo maior é o econômico. Pelo menos essa é a justificativa geralmente apresentada por familiares durante a investigação social, normalmente feita pela instituição quando um idoso não sabe de onde veio. Mas, em algumas situações, verifica-se que a resposta para o abandono dos velhinhos é, na verdade, uma desculpa providencial.
Um dos casos que dificulta tal compreensão é o de uma dentista que teria sido formada pela primeira turma de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP). A aposentada, que para evitar constrangimentos à família será identificada apenas como L., tem 96 anos e não se lembra da última vez que viu seus quatro filhos. O mesmo caso é o da bailarina aposentada Zélia Ricci Gentile, que diz ter dançado com Maria Olenewa - um ícone do balé clássico brasileiro, da década de 50. Vaidosa, se nega a revelar a idade e conta que a família vive no Rio de Janeiro. Quantos não enfrentaram filas para se utilizarem dos préstimos das duas mulheres quando elas estavam em plena atividade profissional! Agora, compartilhando da mesma condição no Lar dos Velhinhos - onde dizem se sentirem muito bem - ninguém as procura.
Assim como os demais idosos do Lar, as duas senhoras usufruem de assistência médica e odontológica diária e de periódicas atividades culturais e sociais. Quando não estão conversando, estão assistindo a tevê ou até ajudando na cozinha e na limpeza.
Pelo Lar São Francisco de Assis passou o pernambucano José Ferreira de Araújo, de 65 anos. Atualmente, é atendido na Creche do Idoso e, à noite, dorme na Casa de Estar Ferdiano Alves, uma espécie de abrigo Municipal para moradores de rua. De acordo com a assistente social Maria Aparecida Ferreira de Freitas, quando foi encontrado na rua, Araújo estava ferido e parcialmente cego em razão de uma catarata. Após ser submetido à cirurgia, voltou a enxergar. No entanto, o alcoolismo o fez voltar às ruas. Acolhido no plantão social da Prefeitura, abandonou o cigarro, a bebida e hoje, além de receber assistência, é voluntário na Creche do Idoso. “Estou vivendo uma nova vida. Terminei a sexta série e estou na sétima, fazendo também informática. Quero ser alguém na vida”, disse.
A Creche do Idoso, mantida pela Secretaria de Promoção Social (Sepros), presta atendimento diferente do Lar dos Velhinhos. O serviço é uma novidade na região e, talvez, no País. Tal qual uma instituição para crianças, a Creche do Idoso é um lugar para quem necessita de atenção enquanto seus parentes trabalham. Com exceção de Araújo, cujos familiares vivem no Nordeste, todos na creche têm família. Para aqueles que não têm como ser levados à unidade, um veículo da Prefeitura os apanha em casa e os devolve no fim da tarde, de segunda a sexta-feira.
A inovadora idéia surgiu em meados da década de 90, quando a presidente do Fundo Social de Solidariedade de Praia Grande, a primeira-dama Maria Del Carmen Padin Mourão, passou a conhecer o drama de algumas famílias carentes que recorriam ao Lar dos Velhinhos para garantir assistência aos seus familiares. “A prioridade do Lar São Francisco de Assis é atender pessoas que não têm família. Mas ficávamos comovidos com a situação de pessoas que precisavam trabalhar e não tinham como pagar para alguém cuidar dos pais ou avós. Então surgiu a idéia da creche”.
De acordo com Maruca, como é mais conhecida a primeira-dama, assim que chegam à creche, os velhinhos tomam café, almoçam e no fim da tarde são levados para casa. “Na creche, têm companhia, conversam, jogam cartas, assistem a tevê e, aqueles que necessitam, passam por atendimento médico. Tudo isso é feito gratuitamente e com muito amor. Eles ficam felizes e nós também”, disse.
Quando a idéia da creche para idosos foi concebida, Maruca e sua equipe talvez nem tenham se dado conta da nobreza de semelhante atitude. Mas o fato é que o serviço foi de grande importância para algumas pessoas. Para a assessora contábil Elizabete Diniz Paiva, a Creche do Idoso deu novo rumo à vida de sua mãe Naisy Diniz, de 84 anos. “Para mim, minha mãe renasceu na creche. Quando ela foi para lá estava com depressão porque meu marido tinha câncer e eu trabalhava fora. Se não existisse esse serviço hoje eu não teria mais mãe. Mesmo que eu tivesse como pagar alguém, ela não teria contato com outros idosos, não teria o carinho dos voluntários, o que foi muito bom para ela”.
A ginástica, que é ministrada semanalmente na creche, é uma das atividades que Naisy mais gosta, além do passeio. A comida também é outro item muito elogiado pela aposentada. A culinária, aliás, é uma das opções mais apreciadas pelas demais usuárias da casa. Por causa da excelência do serviço, o projeto vem sendo visitado por prefeituras paulistas e até de fora do Estado.
As cidades de São Caetano do Sul, Mongaguá, Santos, Jales e Fernandópolis já estiveram em Praia Grande para conhecer, além da creche, os projetos que beneficiam milhares de idosos na Cidade.
Conforme a diretora da Creche do Idoso do Município, a pedagoga Neuracy da Cunha Gomes, Santa Fé do Sul já inaugurou uma creche do idoso usando como modelo a unidade de Praia Grande. “Muitos conhecem nosso trabalho pelo jornal eletrônico PG Notícias ou quando vêm passear aqui”, comentou.
Além do Lar São Francisco de Assis e da Creche do Idoso, os velhos - que representam uma parcela de 15% dos 250 mil cidadãos praiagrandenses - contam com outro serviço: o Programa Conviver. Quatro espaços são destinados a pessoas com mais de 50 anos para que usufruam de leitura, sala de vídeo, varanda com jogos de mesa e piscina, além de poderem aprender ou ensinar artesanato, costura ou culinária.
Nas unidades à beira-mar - Vivência Ocian e Boqueirão - as atividades são voltadas ao condicionamento físico, esportes e lazer. Atualmente, o programa conta com mais de 5 mil inscritos. São locais onde o conforto se mistura ao riso e diálogos numa sonoridade que substitui a lamúria e a tristeza daqueles que já haviam perdido as esperanças de sentir, novamente, o prazer de viver.
Se alguém descumpre os respeitos básicos ao direito do idoso há o Conselho Municipal. Por meio da entidade, conselheiros fiscalizam casas particulares de abrigo e também acompanham denúncias de maus tratos a idosos. E, para assuntos diversos, a Prefeitura conta com a Divisão da Terceira Idade, que é o setor responsável pelo nascimento do Programa Conviver e de outras políticas de valorização da vida da população idosa da Cidade.
Rubem Alves e tantos outros nomes como Guilherme de Almeida, Mário Quintana ou os não tão conhecidos Antonio Carlos de Paula e Adélia Prado. Todos esses têm algo em comum com Praia Grande. Não têm vergonha de demonstrar seu respeito aos velhinhos, dedicando-lhes linhas de poesias com significado de amor e cuidado.
Com essa atitude, Praia Grande faz coro com Olavo Bilac: “Não choremos, amigo, a mocidade! Envelheçamos rindo...como as árvores fortes envelhecem, na glória de alegria e da bondade, agasalhando os pássaros nos ramos, dando sombra e consolo aos que padecem!”.
A segunda forma é mais usual porque a primeira seria politicamente incorreta, um tanto grosseira. O Estatuto, no entanto, é do Idoso e, entre muitos direitos garantidos aos mais velhos, os mais cumpridos são o atendimento prioritário em bancos e o espaço especial em ônibus e metrôs. Mas o idoso, ou o velho, especialmente o de baixa renda, precisa de muito mais.
Em Praia Grande, um lugar chamado carinhosa e adequadamente de “Lar dos Velhinhos”, há mais de 20 anos acolhe essas pessoas num esforço de amenizar seus amargores de desprezo e ingratidão. O local era mantido pelo Rotary Club, que devido aos elevados custos de manutenção transferiu a administração da casa à Prefeitura, no início da década de 90. Na época, eram 40 abrigados. Hoje o lar atende 70 pessoas – a maioria não recebe visita de parente algum. É chamado agora de Lar São Francisco de Assis, mas o nome antigo persiste popularmente como referência ao lugar.
O diretor da unidade é o aposentado Silvio de Lima, que cuida de cada idoso com a mesma dedicação de um pai adotivo. Muitos dos que já estiveram no lar e morreram talvez tenham recebido ali o único tratamento decente de todas suas vidas. Alguns passaram por cirurgia, receberam medicamentos ou ganharam identidade, já que é comum sequer lembrarem dos próprios nomes. “Aqui tentamos dar um final de vida digno a essas pessoas”, comenta Silvio.
Dificilmente um estudo, por mais minucioso que seja, revelaria a quantidade de velhos que recebem de parentes tratamento digno no final de suas vidas. Sem que seja necessária uma estatística, é possível supor quais seriam as principais razões que levam pessoas a abandonarem seus pais, avós, tios ou sogros. Segundo Silvio de Lima, o motivo maior é o econômico. Pelo menos essa é a justificativa geralmente apresentada por familiares durante a investigação social, normalmente feita pela instituição quando um idoso não sabe de onde veio. Mas, em algumas situações, verifica-se que a resposta para o abandono dos velhinhos é, na verdade, uma desculpa providencial.
Um dos casos que dificulta tal compreensão é o de uma dentista que teria sido formada pela primeira turma de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP). A aposentada, que para evitar constrangimentos à família será identificada apenas como L., tem 96 anos e não se lembra da última vez que viu seus quatro filhos. O mesmo caso é o da bailarina aposentada Zélia Ricci Gentile, que diz ter dançado com Maria Olenewa - um ícone do balé clássico brasileiro, da década de 50. Vaidosa, se nega a revelar a idade e conta que a família vive no Rio de Janeiro. Quantos não enfrentaram filas para se utilizarem dos préstimos das duas mulheres quando elas estavam em plena atividade profissional! Agora, compartilhando da mesma condição no Lar dos Velhinhos - onde dizem se sentirem muito bem - ninguém as procura.
Assim como os demais idosos do Lar, as duas senhoras usufruem de assistência médica e odontológica diária e de periódicas atividades culturais e sociais. Quando não estão conversando, estão assistindo a tevê ou até ajudando na cozinha e na limpeza.
Pelo Lar São Francisco de Assis passou o pernambucano José Ferreira de Araújo, de 65 anos. Atualmente, é atendido na Creche do Idoso e, à noite, dorme na Casa de Estar Ferdiano Alves, uma espécie de abrigo Municipal para moradores de rua. De acordo com a assistente social Maria Aparecida Ferreira de Freitas, quando foi encontrado na rua, Araújo estava ferido e parcialmente cego em razão de uma catarata. Após ser submetido à cirurgia, voltou a enxergar. No entanto, o alcoolismo o fez voltar às ruas. Acolhido no plantão social da Prefeitura, abandonou o cigarro, a bebida e hoje, além de receber assistência, é voluntário na Creche do Idoso. “Estou vivendo uma nova vida. Terminei a sexta série e estou na sétima, fazendo também informática. Quero ser alguém na vida”, disse.
A Creche do Idoso, mantida pela Secretaria de Promoção Social (Sepros), presta atendimento diferente do Lar dos Velhinhos. O serviço é uma novidade na região e, talvez, no País. Tal qual uma instituição para crianças, a Creche do Idoso é um lugar para quem necessita de atenção enquanto seus parentes trabalham. Com exceção de Araújo, cujos familiares vivem no Nordeste, todos na creche têm família. Para aqueles que não têm como ser levados à unidade, um veículo da Prefeitura os apanha em casa e os devolve no fim da tarde, de segunda a sexta-feira.
A inovadora idéia surgiu em meados da década de 90, quando a presidente do Fundo Social de Solidariedade de Praia Grande, a primeira-dama Maria Del Carmen Padin Mourão, passou a conhecer o drama de algumas famílias carentes que recorriam ao Lar dos Velhinhos para garantir assistência aos seus familiares. “A prioridade do Lar São Francisco de Assis é atender pessoas que não têm família. Mas ficávamos comovidos com a situação de pessoas que precisavam trabalhar e não tinham como pagar para alguém cuidar dos pais ou avós. Então surgiu a idéia da creche”.
De acordo com Maruca, como é mais conhecida a primeira-dama, assim que chegam à creche, os velhinhos tomam café, almoçam e no fim da tarde são levados para casa. “Na creche, têm companhia, conversam, jogam cartas, assistem a tevê e, aqueles que necessitam, passam por atendimento médico. Tudo isso é feito gratuitamente e com muito amor. Eles ficam felizes e nós também”, disse.
Quando a idéia da creche para idosos foi concebida, Maruca e sua equipe talvez nem tenham se dado conta da nobreza de semelhante atitude. Mas o fato é que o serviço foi de grande importância para algumas pessoas. Para a assessora contábil Elizabete Diniz Paiva, a Creche do Idoso deu novo rumo à vida de sua mãe Naisy Diniz, de 84 anos. “Para mim, minha mãe renasceu na creche. Quando ela foi para lá estava com depressão porque meu marido tinha câncer e eu trabalhava fora. Se não existisse esse serviço hoje eu não teria mais mãe. Mesmo que eu tivesse como pagar alguém, ela não teria contato com outros idosos, não teria o carinho dos voluntários, o que foi muito bom para ela”.
A ginástica, que é ministrada semanalmente na creche, é uma das atividades que Naisy mais gosta, além do passeio. A comida também é outro item muito elogiado pela aposentada. A culinária, aliás, é uma das opções mais apreciadas pelas demais usuárias da casa. Por causa da excelência do serviço, o projeto vem sendo visitado por prefeituras paulistas e até de fora do Estado.
As cidades de São Caetano do Sul, Mongaguá, Santos, Jales e Fernandópolis já estiveram em Praia Grande para conhecer, além da creche, os projetos que beneficiam milhares de idosos na Cidade.
Conforme a diretora da Creche do Idoso do Município, a pedagoga Neuracy da Cunha Gomes, Santa Fé do Sul já inaugurou uma creche do idoso usando como modelo a unidade de Praia Grande. “Muitos conhecem nosso trabalho pelo jornal eletrônico PG Notícias ou quando vêm passear aqui”, comentou.
Além do Lar São Francisco de Assis e da Creche do Idoso, os velhos - que representam uma parcela de 15% dos 250 mil cidadãos praiagrandenses - contam com outro serviço: o Programa Conviver. Quatro espaços são destinados a pessoas com mais de 50 anos para que usufruam de leitura, sala de vídeo, varanda com jogos de mesa e piscina, além de poderem aprender ou ensinar artesanato, costura ou culinária.
Nas unidades à beira-mar - Vivência Ocian e Boqueirão - as atividades são voltadas ao condicionamento físico, esportes e lazer. Atualmente, o programa conta com mais de 5 mil inscritos. São locais onde o conforto se mistura ao riso e diálogos numa sonoridade que substitui a lamúria e a tristeza daqueles que já haviam perdido as esperanças de sentir, novamente, o prazer de viver.
Se alguém descumpre os respeitos básicos ao direito do idoso há o Conselho Municipal. Por meio da entidade, conselheiros fiscalizam casas particulares de abrigo e também acompanham denúncias de maus tratos a idosos. E, para assuntos diversos, a Prefeitura conta com a Divisão da Terceira Idade, que é o setor responsável pelo nascimento do Programa Conviver e de outras políticas de valorização da vida da população idosa da Cidade.
Rubem Alves e tantos outros nomes como Guilherme de Almeida, Mário Quintana ou os não tão conhecidos Antonio Carlos de Paula e Adélia Prado. Todos esses têm algo em comum com Praia Grande. Não têm vergonha de demonstrar seu respeito aos velhinhos, dedicando-lhes linhas de poesias com significado de amor e cuidado.
Com essa atitude, Praia Grande faz coro com Olavo Bilac: “Não choremos, amigo, a mocidade! Envelheçamos rindo...como as árvores fortes envelhecem, na glória de alegria e da bondade, agasalhando os pássaros nos ramos, dando sombra e consolo aos que padecem!”.