Com profissionalismo e amor, Caps II Boqueirão se transforma em referência

Atendimento da equipe multidisciplinar ajudou moradora a superar trauma familiar

3/11/2021

Acolhimento, compreensão, amor. É dessa forma que Ivete Toledo Bonizzoni, 68 anos, foi recebida no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) II Boqueirão e conseguiu superar um trauma grande em sua vida. Há oito anos ela se viu sozinha de maneira repentina em São Paulo, após uma separação traumática e a saída dos filhos de casa, tudo em pouco mais de um mês. A solução foi vir para a Praia Grande, onde ela realizou o sonho de morar na praia e também encontrou o suporte que precisava para buscar um novo horizonte em sua vida.

“Eu só tenho a agradecer por esse serviço. Tem sido muito importante para mim. Aqui eu encontrei apoio, amor, dedicação num momento muito difícil da minha vida. Muitas pessoas estão sofrendo sem saber que tem uma luz no fim do túnel, que é procurar a saúde mental, porque tudo que a gente passa na vida tem a ver com nossos sentimentos e emoções. Nossa mente comanda tudo. E quando sai um pouquinho do eixo é preciso de profissionais que nos auxiliem”, conta Ivete.

Sem conhecer ninguém na cidade na época, Ivete logo procurou auxílio psicológico e foi encaminhada ao Caps. Após avaliação, passou por sessões individuais e depois para o grupo de terapia, onde se encontrou de vez. “Eu me sentia muito culpada, achava que os problemas eram só meus e não eram. E com a ajuda dos profissionais do Caps eu pude, de degrau a degrau, vencer esse momento. E o grupo foi a família que encontrei aqui, a gente divide experiência, carinho, todo mundo fala a mesma língua. Mas claro, a vida não se tornou um mar de rosas, os problemas vão continuar, só que a maneira de enfrentá-los passou a ser diferente”, afirma.

Para que mais pessoas como a dona Ivete tenham a atenção necessária, Praia Grande montou uma grande estrutura de atenção psicossocial. Além do Caps II Boqueirão, que faz uma média de 1,6 mil atendimentos por mês, o Município conta ainda com outro Caps II, no Bairro Mirim, além do Caps Infantil e do Caps Álcool e Drogas (Caps AD III) 24 horas. Todos atuam em rede com a Atenção, Básica, Urgência e Emergência e demais setores da Secretaria de Saúde Pública (Sesap). Para os casos de pequena gravidade, por exemplo, os médicos das Unidades de Saúde da Família receberam treinamento para poder atender os pacientes. Já os mais complexos são encaminhados pelas unidades ao tratamento psicológico.

“O Caps é um equipamento para os casos graves e instáveis. Quando falamos que o Caps é porta aberta, ele é para aqueles pacientes que tratavam e desistiram, que tinham convênio e perderam, faziam tratamento em outra cidade ou Estado ou ainda para pacientes advindos de internação psiquiátrica. Esses casos não precisam de encaminhamento. Mas há situações em que a gente percebe com o olhar técnico que é um caso para cá, então, já acolhe imediatamente”, explica a diretora do Caps II Boqueirão, Hilda Maria Ferreira Jaguary Dias.

O trabalho realizado pelo Caps se transformou em referência em saúde mental e chamou a atenção de entidades de ensino. Às sextas-feiras os alunos do terceiro ano de Medicina da Universidade São Judas fazem estágio na unidade.

O acolhimento de pacientes ocorre de segunda à sexta-feira, das 10h às 13h, pela equipe multidisciplinar, que faz uma escuta qualificada que agiliza o atendimento de muitos casos. Há também trabalhos feitos em parceria. Por exemplo, o paciente fica no Caps Infantil até completar 18 anos, mas poucos meses antes disso o Caps II já recebe esse paciente. Há também um atendimento compartilhado com o Caps AD. “Quando a pessoa é usuária de drogas e tem alguma comorbidades psiquiátrica, a gente troca informações e atende em parceria. O manejo de álcool e drogas fica com o Caps AD e nós ficamos com o manejo do transtorno psiquiátrico”, detalha Hilda.

Após o primeiro atendimento, os profissionais discutem o caso e, se necessário, é desenvolvido um plano terapêutico conforme as características e as necessidades de cada paciente. Esse planejamento indica se a pessoa vai passar em psicoterapia, se o atendimento será breve ou mais longo, se depende da análise da assistente social em relação a alguma questão socioeconômica ou familiar, se vai passar o dia no local (Hospitalidade-Dia) com atividades de terapia ocupacional. Devido à pandemia, alguns atendimentos foram limitados, mas estão sendo retomados de forma responsável.

A terapia ocupacional, inclusive, é uma parte importante da reabilitação, que trabalha com os pacientes que necessitam maior cuidado. Tais casos podem passar o dia no Caps para atividades diversas visando melhorar suas funcionalidades do dia a dia. “A terapia ocupacional trabalha com as ocupações humanas. A gente faz a análise da atividade de acordo com o perfil ocupacional do paciente. Usamos muitas atividades manuais, verbais, com orientações de como desenvolver atividades da vida diária. Antes da pandemia fazíamos muitas ações externas, como visitas ao Palácio das Artes, teatro e expressão corporal, que devem ser retomadas logo, tudo para que o paciente ganhe cada vez mais autonomia”, relata a terapeuta ocupacional Ariane Sgarbi Dias.

Segundo a diretora Hilda, os pacientes são direcionados à Hospitalidade-Dia de acordo com a intensidade do caso, que pode ser intensivo, semi-intensivo e não-intensivo. “Pacientes que não são intensivos na Hospitalidade-Dia vêm para um dia de terapia. Os semi-intensivos podem vir de duas a três vezes na semana e os intensivos vêm de segunda à sexta. E nessa terapia os técnicos estão presentes e avaliam tudo, como o paciente interage, como é de fato. Muitas vezes nesse momento a gente detecta algum problema de violência, por exemplo, então é aqui que a gente vê a importância de ter uma equipe com todos os olhares”, destaca.

Com essa visão e esse trabalho em conjunto da equipe multidisciplinar é possível avançar no objetivo do Caps de dar mais qualidade de vida para a pessoa. “Já tivemos pacientes que chegaram bem desacreditados pela rede e até pela família e que conseguimos obter sucesso com a reabilitação. Essa é a busca do Caps, que a pessoa não pare aqui, mas passe aqui para um período de reabilitação para a vida, claro, no caso dos não-crônicos. E mesmo que o problema seja crônico, reabilitar o máximo possível a pessoa para o mundo lá fora, para viver em comunidade, para a família, e não ficar como antigamente alojados em hospitais psiquiátricos sem funcionalidade nenhuma”, comenta a psicóloga Fabiana Ranea Appa.